São demais os perigos dessa vida, dizia a canção de Toquinho e Vinícius.
Como se não bastassem esses tantos, ainda temos o sr. Tempo, o tira-mau, selecionando impiedosamente quais memórias mantemos e quais não.
Por exemplo: quêde o sabor da água de torneira tomada na rua, nos gentis verões setentistas? E da cocada vendida em cestos, nas ruas, pelo vendedor ambulante do bairro?
E como pude esquecer o moço que fazia aviõezinhos com tubos usados de pasta de dentes Kolynos?
Em que canto da minha mente foi parar o drible de Zico, a cor do esmalte que a moça pela qual nutria secreta paixão usava nas unhas dos pés, a textura do papel de pão, dos gibis, do Jornal dos Sports?
E por que o senhor Tempo teve a ousadia de apagar “Stumblin in In”, com Suzi Quatro e Chris Norman, da tela cinemascope technicolor da minha memória, eu jamais saberei – até que nós, eu e o Tempo, nos reencontremos na clareira do final do caminho. Temos negócios inacabados, eu e ele.
Mas hoje eu revi a canção, essa doce pérola pop de 1978, e, como sou um senhor de certa idade bonzinho, compartilho com vocês.
Professor e historiador como profissão – mas um cara que escreve com (o) paixão.