19 de maio de 2024
Colunistas

Encontros e despedidas

A chuva lá fora me convida a ficar. E eu, que já quase nunca recuso um convite para não sair de casa, cedo. E fico pensando nas partidas e chegadas, não na música do Milton, mas nos encontros e despedidas que a vida nos dá com uma mão e nos tira com a outra.

Eu vendo o céu cinzento da janela da casa da minha tia e torcendo para que me deixassem ficar mais uma noite, dormindo no sofá da sala. O cara que fazia aviõezinhos e carrinhos com tubos de pasta de dentes na rua. A moça que me ensinou a beijar. A primeira namorada. A primeira. As cartas que chegavam em casa. Aquela vez que vi o mar. Que viajei só. Que dormi fora. Que dormi na rua. As moças angolanas que trabalhavam na padaria da esquina, fugidas da guerra. Os horários das aulas. Os antigos números de telefone. Os endereços onde vivi. Os sabores. Do chicabon. Do Kri. Do Grapette e do Crush. O som do meu primeiro violão. O som do primeiro sim.

Eu vejo em um retrato em technicolor com som surround todas essas memórias, tudo gravado a ferro, tudo tatuado nas retinas, até o cheiro do almoço domingueiro nas tardes de domingo de 1980, embora eu mal me lembre do que comi no almoço de ontem.

As estrelas, uma multidão.

De tudo, fica a certeza: há mais estrelas no céu quando se é criança.

Joseph Agamol

Professor e historiador como profissão - mas um cara que escreve com (o) paixão.

Professor e historiador como profissão - mas um cara que escreve com (o) paixão.

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