29 de abril de 2024
Veículos

Como desencalhar os carros?

Pátios da VW em São Bernardo do Campo, lotados de carros – arte sobre foto da internet

A imagem dos pátios da fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo, abarrotados de carros novinhos, foi uma das mais comentadas desta semana. Ela surgiu junto com a notícia de que, mais uma vez, a montadora vai suspender sua produção temporariamente e colocar seus empregados de licença por 10 dias neste começo de julho. A causa apontada é a estagnação do mercado no Brasil, com vendas de mornas a frias, mesmo com a redução pontual nos impostos (preços) de modelos até R$ 120 mil por pacote governamental.

Esse pacote deu, sim, um empurrãozinho nas vendas desses carros novos – e até de outros, um pouquinho mais caros e de usados, quem sabe por “efeito psicológico”. Mas, ao que parece, não tem sido o suficiente para manter a indústria em pleno funcionamento.

Há quem atribua isso exclusivamente ao alto preço cobrado pelos carros aqui no Brasil – o que é fato, mas nunca foi obstáculo significativo para as vendas. Isso porque por aqui, “tradicionalmente”, carro é coisa que se compra a prazo, ou no mínimo financiado em parte, especialmente pela classe média. E é aí que está a questão.

Juro que é de verdade

Entre tantas outras consequências, intencionais ou não, de se manter a taxa básica de juros na vizinhança das estrelas, está a inviabilização do chamado crediário, especialmente para bens de grande valor e com um número grande de parcelas. Comprar carro com “pequena entrada” e mais de 50 prestações era o normal para grande parte dos compradores de carro zero. Mas com cerca de 30% de juros ao ano, na prática, isso pode significar até levar um carro e pagar por mais meio.

E mesmo o próprio preço final dos carros “à vista” acaba sendo inflado por esse, digamos, custo financeiro. Fica mais caro para todas as empresas que dependem do sistema financeiro para girarem seus negócios (ou seja, a imensa maioria delas) produzir qualquer coisa. E isso é repassado a peças, componentes, serviços e tudo mais o que está envolvido na montagem de um carro.

Além disso, todo o aprimoramento e desenvolvimento de novos produtos e tecnologias – que também depende de investimento e de crédito – fica comprometido. Sabe a tal transição para veículos eletrificados, híbridos ou puramente elétricos? Pois é, ela também vai demorar um pouco mais por causa da atual política monetária.

Este seu colunista aqui não é lá muito versado em economia e, talvez, meu maior feito nesse campo seja conseguir pagar as contas no final do mês. Mas, como milhões de outras pessoas, evito assumir dívidas quando me sinto inseguro quanto à capacidade de honrá-las sem sacrificar a qualidade de vida, minha e dos que dependem de mim. Não compraria um carro zero agora, com ou sem desconto, a menos que pudesse pagar a vista por ele.

Pelo jeito, o comportamento de pessoas como eu tem grande impacto no mercado, o suficiente até para que grandes montadoras suspendam sua produção. Se me permitem um pitaco: já passou da hora de o Banco Central soltar o freio de mão – por mais que isso contrarie as “convicções” de alguns e a quem está lucrando trilhões com a situação atual. Galinhas dos ovos de ouro são mortais. Sigamos em marcha baixa, com cautela, mas em frente.

Para alguns, um bom negócio

Sem sair totalmente do tema, mas mudando de assunto, um último comentário: na primeira fase desse programa de estímulo à compra de carros “populares” até R$ 120 mil, a benesse estava restrita a pessoas físicas, deixando de fora as locadoras de automóveis – hoje responsáveis por uma fatia significativa do mercado. Agora, esse desconto também está sendo liberado para empresas.

Se isso por um lado amplia os efeitos dessas medidas e, pelo menos por enquanto, pode ajudar a manter as montadoras no azul, por outro, deve se transformar em negócio altamente lucrativo para as locadoras. Isso porque, hoje, elas são as maiores vendedoras dos chamados seminovos (modelos com até dois ou três anos de uso) no país. Comprando com desconto agora, e revendendo pela tabela FIP (a referência do mercado) mais adiante, quando não houver mais esse incentivo, se o mercado já estiver reaquecido (o que é provável), é possível até que consigam mais pelos carros do que pagaram por eles.

Fonte: Rebimboca Comunicação

Henrique Koifman

Jornalista, blogueiro e motorista amador.

Jornalista, blogueiro e motorista amador.

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