9 de maio de 2024
Colunistas Fernando Fabbrini

Dois caminhos

A escolha urgente entre a luz e a escuridão.

Foto: Helvio

Parece que a humanidade chegou mesmo a uma encruzilhada inevitável. Uma das sendas leva ao conhecimento, à autonomia do cidadão, ao crescimento, às conquistas pessoais – e, também, à liberdade de escolher, questionar e até denunciar, quando necessário, a nudez do rei. A outra direção conduz ao atraso e seus costumeiros aliados: a massificação, a censura, a narrativa mentirosa, as guerras, o Estado controlando e comprando consciências. Os defensores desse obscurantismo são os que vivem da ignorância, da violência, da opressão – males que sustentam seus poderes e fortunas.

O documentário “Em Suas Mãos”, da Netflix, merece ser visto. Ele narra a jornada de Zarifa Ghafari, uma afegã que exercia cargo político, apoiava mulheres e educava meninas e moças daquele país. Nas escolas modestas, garotas se assentavam no chão e compartilhavam cadernos e lápis. Apesar da pobreza e dos rostos velados pelos hijabs, via-se brilho e esperança naqueles olhos. Entretanto, com a saída estabanada das tropas norte-americanas, o Talibã trouxe de volta o terror e as trevas.

Uma das primeiras providências da ditadura fundamentalista foi fechar escolas e, outra vez, confinar mulheres em suas casas, açoitando aquelas que saíssem à rua sem o véu. Num desabafo simples, porém inspirado, Zarifa explicou o porquê do ódio do Talibã pela educação:

— Quem estuda faz perguntas; eles não aceitam perguntas.

Eis a definição perfeita – e até meio poética – de algo grave e contemporâneo. Manter a ignorância é a mola mestra do autoritarismo para dominar pessoas no deserto afegão ou nos cafundós do Brasil. Quanto menos souberem, melhor. É fato histórico: sempre que alguém se educa, se informa e confronta tiranos, as respostas são perseguições, prisões e mortes.

Nossa vocação natural é buscar o saber, a autonomia, a prosperidade e sobretudo a liberdade. A vida real não deixa dúvidas: quando caiu o muro de Berlim, os alemães, livres do jugo soviético, correram para o lado ocidental. Da mesma forma, nunca ouvimos notícias de algum rebelde remando frenético para fugir da Flórida rumo a Havana. Assim é a verdade, demolindo teorias falaciosas, justificativas furadas e certas hipocrisias de intelectuais de nossa época.

Aos 43 anos, Rishi Sunak ocupa o posto de primeiro-ministro britânico. Filho de imigrantes indianos, o jovem líder do Partido Conservador é dono de um currículo que inclui mestrados e doutorados em universidades renomadas. Transcrevo o trecho de seu discurso sobre os conflitos da atualidade:

“Por que o Hamas atacou Israel? Não foi apenas pelo ódio, mas também pelo medo de que um novo Oriente Médio estivesse nascendo, um que veria Israel normalizando as relações com seus vizinhos e que deu a esperança de um caminho melhor, mais seguro e mais próspero. E por que a Rússia invadiu a Ucrânia? Porque Putin temia o surgimento de uma democracia moderna, reformadora e rica à sua porta e queria puxá-la de volta para alguma fantasia imperialista do passado”.

Sunak falou de geopolítica, mas, nas entrelinhas, está evidente esta escolha dramática de nosso futuro. Em pleno século XXI, há ainda líderes religiosos, políticos e fanáticos arcaicos que não admitem ouvir perguntas incômodas, mas apenas vozes dos que os obedecem e os bajulam, enquanto sufocam gritos de indignação.

Quando fecharam sua escola, assassinaram seu pai e a ameaçaram de morte, Zarifa Ghafari escapou num dos últimos aviões que decolaram de Cabul. Ainda como professora, reside numa cidade da Alemanha onde leciona para garotas refugiadas. Mesmo com tantos inimigos e reveses, a esperança é sempre uma heroica sobrevivente.

Fonte: O Tempo

Fernando Fabbrini

Escritor e colunista de O TEMPO

Escritor e colunista de O TEMPO

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