13 de maio de 2024
Colunistas Junia Turra

Pai Eterno

Nenhum de nós está preparado para se despedir das pessoas que ama, nem por fatalidade, nem por doença , nem por idade.

Não aprendemos isso e se aprendemos, não funciona o aprendizado.

Os que ficam precisam do abraço, do sorriso, de ouvir a voz, de olhar a cara fechada, o sorriso largo.

Somos matéria. Eles são alma plena.

Para quem não tem mais o pai ao alcance das mãos, o corpo pede o abraço e a alma se enche de saudade.

A memória busca todas as recordações.

Feliz daquele que pode dividir esse espaço terreno com um pai maravilhoso.

Ah, o meu valeu uma vida!

Tudo de melhor que eu sou, aprendi com ele.

A vida segue em frente. Ele seguiu a dele.

A minha ficou esquisita.

Aqui e ali eu me deparo com situações assim:

Olha que lugar lindo, meu pai diria…

Meu carro está com um defeito e o mecânico falou, vou ligar para o meu pai pra ver o que ele acha… Olha o que o político está fazendo, ah, meu pai ia falar…

A opinião dele pesava.

Nem sempre era definitiva. Discordávamos um do outro.

Mas como era sábio o meu pai!

De um lado um leão, do outro um cavalo selvagem.

Por mais que o cavalo demonstre toda sua braveza e saia a galope pelo pasto, é presa fácil para o leão.

Sorte que o leão adorava o cavalo e observava toda aquela “evolução na avenida”, ciente de que ao final do dia, ou depois de alguns dias, lá estaria o cavalo voltando para um “aparte”, para ficar ali sob a proteção do grande rei dos animais.

Só que um rei sabe aprender também.

E houve vezes em que o cavalo não voltou e o leão urrou: – cavalo, você tem razão.

Ou: – cavalo, volta, não importa quem tenha razão.

Agora a situação é incômoda.

O leão não está mais lá.

Não há mais motivo para voltar.

Às vezes não há nem mais motivo pra ir …

Uma parte de mim está faltando.

E todos os dias ela está faltando. Todas as horas.

Nunca houve um Dia dos Pais oficial para mim.

Todos os dias eram dele.

Agora que ele não está aqui, a data oficial é como um grande outdoor na minha janela:
– “Bom dia! Dia de sentir mais saudades ainda” .

O pior é que o Dia dos Pais aonde eu vivo é em outra data.

São dois dias de saudade ainda maior.

O grande poeta barroco Gregório de Matos escreveu:

“O todo sem a parte não é todo;
A parte sem o todo não é parte; Mas se a parte o faz todo sendo parte,
Não se diga que é parte, sendo todo.”

A vida segue!

Nós também não ficaremos para semente.

E eu gosto do que Sócrates disse e que está nos Diálogos de Platão:

-” Passaremos por aqui por no máximo 10 vezes. Um exemplo: Platão, que está em sua terceira encarnação e, nas três como filósofo, não volta mais a esse planeta. Depende da evolução, daquilo que cada um é”.

Mas e depois?

Volta-se para casa, o endereço de origem.

Nem todos nos encontraremos novamente.

Fica a dica:

Sabe aquela sensação de que você conhece a pessoa há tanto tempo? Ou a afinidade que é muito forte? Aquela coisa: somos da mesma turma?

Ah, é muito provável que o endereço original seja o mesmo ou na vizinhança.

E os iguais, de mesma família universal, sempre retornam à casa do Pai.

Nessa grande metáfora, o que importa é saber que quando a porta desse mundinho se fechar, adiante outra se abrirá e me agrada bastante a possibilidade de que, então, lá, esse Pai … seja o meu!

Junia Turra

Jornalista internacional, diretora de TV, atualmente atuando no exterior.

Jornalista internacional, diretora de TV, atualmente atuando no exterior.

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