Nenhum de nós está preparado para se despedir das pessoas que ama, nem por fatalidade, nem por doença , nem por idade.
Não aprendemos isso e se aprendemos, não funciona o aprendizado.
Os que ficam precisam do abraço, do sorriso, de ouvir a voz, de olhar a cara fechada, o sorriso largo.
Somos matéria. Eles são alma plena.
Para quem não tem mais o pai ao alcance das mãos, o corpo pede o abraço e a alma se enche de saudade.
A memória busca todas as recordações.
Feliz daquele que pode dividir esse espaço terreno com um pai maravilhoso.
Ah, o meu valeu uma vida!
Tudo de melhor que eu sou, aprendi com ele.
A vida segue em frente. Ele seguiu a dele.
A minha ficou esquisita.
Aqui e ali eu me deparo com situações assim:
Olha que lugar lindo, meu pai diria…
Meu carro está com um defeito e o mecânico falou, vou ligar para o meu pai pra ver o que ele acha… Olha o que o político está fazendo, ah, meu pai ia falar…
A opinião dele pesava.
Nem sempre era definitiva. Discordávamos um do outro.
Mas como era sábio o meu pai!
De um lado um leão, do outro um cavalo selvagem.
Por mais que o cavalo demonstre toda sua braveza e saia a galope pelo pasto, é presa fácil para o leão.
Sorte que o leão adorava o cavalo e observava toda aquela “evolução na avenida”, ciente de que ao final do dia, ou depois de alguns dias, lá estaria o cavalo voltando para um “aparte”, para ficar ali sob a proteção do grande rei dos animais.
Só que um rei sabe aprender também.
E houve vezes em que o cavalo não voltou e o leão urrou: – cavalo, você tem razão.
Ou: – cavalo, volta, não importa quem tenha razão.
Agora a situação é incômoda.
O leão não está mais lá.
Não há mais motivo para voltar.
Às vezes não há nem mais motivo pra ir …
Uma parte de mim está faltando.
E todos os dias ela está faltando. Todas as horas.
Nunca houve um Dia dos Pais oficial para mim.
Todos os dias eram dele.
Agora que ele não está aqui, a data oficial é como um grande outdoor na minha janela:
– “Bom dia! Dia de sentir mais saudades ainda” .
O pior é que o Dia dos Pais aonde eu vivo é em outra data.
São dois dias de saudade ainda maior.
O grande poeta barroco Gregório de Matos escreveu:
“O todo sem a parte não é todo;
A parte sem o todo não é parte; Mas se a parte o faz todo sendo parte,
Não se diga que é parte, sendo todo.”
A vida segue!
Nós também não ficaremos para semente.
E eu gosto do que Sócrates disse e que está nos Diálogos de Platão:
-” Passaremos por aqui por no máximo 10 vezes. Um exemplo: Platão, que está em sua terceira encarnação e, nas três como filósofo, não volta mais a esse planeta. Depende da evolução, daquilo que cada um é”.
Mas e depois?
Volta-se para casa, o endereço de origem.
Nem todos nos encontraremos novamente.
Fica a dica:
Sabe aquela sensação de que você conhece a pessoa há tanto tempo? Ou a afinidade que é muito forte? Aquela coisa: somos da mesma turma?
Ah, é muito provável que o endereço original seja o mesmo ou na vizinhança.
E os iguais, de mesma família universal, sempre retornam à casa do Pai.
Nessa grande metáfora, o que importa é saber que quando a porta desse mundinho se fechar, adiante outra se abrirá e me agrada bastante a possibilidade de que, então, lá, esse Pai … seja o meu!
Jornalista internacional, diretora de TV, atualmente atuando no exterior.