Esqueci os números que sonhei – será o Benedito que seriam justamente os da sorte? Por outro lado, nunca me saíram da memória o telefone das primeiras namoradas. Esqueci também a equipe campeã, mas guardei com carinho a lembrança dos que perderam – jogando mais bonito.
Esqueci o que comi no almoço ontem? Esqueci. Mas o sabor do bolo formigueiro feito pela tia está vivo na mente – e na língua, se bobear.
Às vezes esqueço a rua em que preciso entrar para chegar em casa – mas refaço de cor o trajeto que percorria, a pé, para a escolinha onde fiz o fundamental.
Esqueci o perfume de quem nunca amei de verdade – mas jamais o da loção de barba do meu vô, ao me abraçar quando sentíamos, os dois, medo das tempestades.
Como nunca se perderam de mim o aroma da padaria da esquina da minha casa. Ou da chuva quando acabava de desabar. Ou do mar, ainda puro, da minha cidade nos anos 70.
Confesso que esqueci de quase tudo que planejei para o dia de hoje, quase tudo. Mas os planos e sonhos do menino que fui, há quarenta anos, esses não saem de mim.
Estão vivos, do jeito que o menino está. E ainda me fazem viver.
Professor e historiador como profissão – mas um cara que escreve com (o) paixão.