28 de março de 2024
Sergio Vaz

Não tem jeito mesmo: o governo não sabe o que fazer

d626d6e055e85dedc5a7dee901f61004Se é que o ano começa depois do carnaval, o ano começou muito mal. “Com previsão de novo rombo, governo não sabe onde cortar”, diz a manchete de O Globo do segundo dia útil de 2016, a sexta, 12. “Governo adia corte e agrava temor sobre política fiscal”, diz a manchete do Estadão.
Na Folha de S. Paulo, o título foi: “Para economistas, governo abandonou a meta fiscal”.
O governo deve o equivalente a 70% do PIB – 70% de todas as riquezas que o Brasil produz ao longo de um ano. Os governos, como se sabe, não produzem riqueza alguma – não produzem um centavo sequer. Só se apropriam de parte considerável – cerca de 40%, no nosso caso – do que os brasileiros todos, pessoas físicas e empresas, produzem.
Porém, mesmo tomando dos brasileiros quase metade do que nós produzimos, e nos dando de volta serviços da pior qualidade – quando dá –, o governo Dilma Rousseff veio aumentando mais e mais a sua dívida.
Por sua incompetência, por seus seguidos erros, equívocos, absurdos, o governo Dilma Rousseff enfiou o país numa crise como nunca houve, com inflação acima de 10% e sem perspectiva de alteração, desemprego em alta, recessão e dívida pública no céu.
A única saída possível seria uma redução do peso do Estado, um corte nos gastos de custeio da máquina – cada vez mais inchada e mais ineficiente.
Depois da enxurrada de mentiras que disse na campanha eleitoral de 2014, Dilma Rousseff deu sinais de que tinha sido convencida a fazer cortes, a fazer algum ajuste fiscal. Chamar Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda era um indício disso.
Mas Joaquim Levy foi defenestrado, sem ter conseguido de fato avançar no ajuste fiscal.
E agora são cada vez mais claros os sinais de que o governo não está mesmo disposto a fazer cortes.
O que é louco, é insano, é suicida – mas é perfeitamente compreensível.
Afinal, Dilma Rousseff se acha a maior economista que já pisou na face da Terra, e tem a absoluta certeza de que esse negócio de ajuste fiscal é coisa do FMI, de gringo de zóio azul, de coxinha, de neoliberal, da direita, em suam.
Dilma Rousseff é daquele tipo de idiota que acredita que há um jeito de administrar as contas públicas de esquerda e um jeito de administrar as contas públicas de direita.
Cortar gastos, para ela, é coisa de direita.
Dilma Rousseff acredita em almoço de graça.
Acredita também em saci pererê, boitatá e cururipa. Em Papai Noel, não – Papai Noel é coisa de direita, igual a só gastar o que se tem em caixa.
É exatamente isso, em palavras um pouco menos exaltadas, o que dizem em seus artigos no Globo desta sexta-feira, 12 de fevereiro, Rogério Furquim Werneck e Míriam Leitão.
“A dívida pública vai superar os 80% do PIB em 2018”, escreve Míriam Leitão. “Isso significa que, ao fim do atual mandato, a dívida pública terá subido 30 pontos percentuais do PIB no governo Dilma. Isso é um aumento assustador. Será que ninguém olha números em Brasília?”
E Rogério Furquim Werneck escreve: Salta aos olhos que faltam ao governo convicção, credibilidade e apoio político para levar adiante as medidas que seriam necessárias para sinalizar essa mudança crível de regime fiscal.
A íntegra dos dois artigos vai um pouco mais abaixo. Antes, transcrevo reportagem do Estadão desta sexta, em que analistas demonstram que o pessimismo do mercado aumentou ainda mais.
Adiamento de cortes aumenta pessimismo
Por Luiz Guilherme Gerbelli, no Estadão, em 12/2/2016
A decisão do governo de adiar para março o anúncio do corte no Orçamento fez com que piorasse a percepção de risco do mercado financeiro com a economia brasileira. No mercado financeiro e entre os analistas, o corte no Orçamento é considerado fundamental para sinalizar se a equipe econômica vai conseguir cumprir a promessa de entregar este ano o superávit primário (a economia para pagamento dos juros da dívida) prometido, de 0,5% do PIB.
“O adiamento do anúncio pode mostrar que não existe uma certeza sobre o número”, diz Fabio Klein, economista da Tendências Consultoria.
O anúncio do adiamento foi um dos componentes que provocaram a queda da Bovespa ontem, junto com a deterioração no mercado internacional. A bolsa paulista fechou em queda de 2,62%. O dólar, por sua vez, fechou em alta de 1,43%.
Um contingenciamento estimado entre R$ 23 bilhões e R$ 30 bilhões, de acordo com a Tendências, ainda faria com que o governo tivesse um déficit primário de 0,7% do PIB a 0,8% do PIB. “A situação é dramática. O governo não tem meios no curto prazo para fazer com que a despesa caia tanto quanto a receita”, afirma Klein. “Na maioria das vezes, o gasto está enrijecido e comprometido”, diz.
Dívida em alta. A dificuldade em entregar um superávit primário razoável deverá levar a um novo aumento da dívida pública em relação ao PIB. Nas contas da MB Associados, a dívida bruta deverá chegar a 75% do PIB este ano – encerrou 2015 em 66,2% do PIB. Se o governo realmente quisesse estabilizar a dívida, o superávit primário teria de ser de 4,8% do PIB.
“Poderia eventualmente ser (um superávit) menor se o governo sinalizasse um ajuste forte que permitisse uma queda mais rápida dos juros e a possibilidade de crescimento econômico no momento seguinte”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “Mas estamos longe desse cenário. O esforço fiscal necessário hoje está além do que foi feito em 99 e 2003 (anos de ajuste) e não parece haver disposição nem força política por parte do governo para tocar seriamente no problema”, afirma.
Por ora, a projeção da MB Associados é a de que a economia brasileira vai encerar o ano com um déficit primário de 1%. “Há chance de aumentarmos essa projeção para números próximos de 1,5% do PIB”, afirma Vale.
No ano passado, o governo previa inicialmente um superávit primário de 1,1% do PIB, mas, com a deterioração do cenário, o número foi mudado, em julho, para apenas 0,15% do PIB. Mas nem isso foi possível entregar. No final do ano, foi registrado um déficit primário de R$ 120 bilhões, ou cerca de 2% do PIB.
Encenação de combate à crise
Artigo de Rogério Furquim Werneck em O Globo, em 12/2/2016.
Sem condições de tomar as medidas que se fazem necessárias para debelar a avassaladora crise econômica em que meteu o país, o governo vem tentando dissimular suas limitações com uma patética encenação de combate.
A dimensão mais alarmante do desastroso quadro econômico que hoje enfrenta o Brasil não é propriamente a recessão e a inflação de dois dígitos e, sim, a paralisante falta de perspectiva com que se debatem investidores, empresas e famílias, descrentes da capacidade do governo de restabelecer controle sobre as contas públicas. Para que o país vislumbre uma saída ordenada da crise e rompa a paralisia decisória que a vem agravando, o governo tem de ser capaz de sinalizar uma mudança crível de regime fiscal, que permita entrever evolução sustentável das contas públicas no futuro.
É aqui que a coisa pega. Salta aos olhos que faltam ao governo convicção, credibilidade e apoio político para levar adiante as medidas que seriam necessárias para sinalizar essa mudança crível de regime fiscal. Mas, no aperto em que se encontra, o governo decidiu agora ensaiar novo discurso, em que se permite vagas menções ao controle da expansão do gasto público e alusões perfunctórias à necessidade de uma reforma “exequível e justa” da Previdência.
Aos incrédulos, o que se pede é que acreditem que, de repente — 11 anos após ter liderado, com grande estardalhaço, o torpedeamento da proposta de contenção da expansão do gasto público feita pelo então ministro Antonio Palocci —, Dilma Rousseff estaria, afinal, convencida de que a contenção de gastos faz todo o sentido. E que também acreditem que a mesma equipe econômica que por tanto tempo festejou o expansionismo fiscal irresponsável, sob a bandeira da nova matriz macroeconômica, estaria de repente imbuída da necessidade de medidas severas de contenção de gastos.
Credibilidade à parte, o próprio governo não esconde sua preocupação com os efeitos colaterais desse tímido ensaio de mudança de discurso. O Planalto e a Fazenda têm feito das tripas coração para tentar conciliar o inconciliável. Bem sabem que, por vagas que sejam, as menções a medidas de contenção de gastos e as alusões à reforma da Previdência foram muito mal recebidas no PT e nos chamados movimentos sociais, de cujo apoio a presidente não pode prescindir na difícil quadra que atravessa.
Sem ir mais longe, basta ter em conta a reação do atual ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto. Se a presidente estivesse de fato empenhada em promover reformas na Previdência, não teria entregue o ministério da área, há pouco mais de três meses, a figura tão insensível à assustadora aritmética adversa que vem determinando a evolução das contas previdenciárias.
Espertamente, partidos que compõem a base aliada já fizeram ver ao Planalto que só terão condições de apoiar esforços de contenção de gastos e alterações de regras de acesso a benefícios previdenciários se as medidas contempladas pelo governo puderem contar com respaldo explícito e inequívoco do PT.
É pouco provável que isso venha a ocorrer. Às voltas com o desgaste político imposto pela operação Lava-Jato e pelos desastrosos cinco anos de governo Dilma, o PT já tem razões de sobra para se alarmar com o que as eleições municipais de outubro lhe reservam. É difícil que, a esta altura, se disponha a se desgastar ainda mais com o minguado eleitorado fiel que lhe restou, abandonando de repente seu velho discurso de resistência à contenção de gasto público e à reforma da Previdência.
O governo está cansado de saber disso. E não é por outra razão que tem mantido um discurso tão vago sobre as medidas fiscais com que acena, escorado em promessas evasivas de envio de propostas concretas ao Congresso “nos próximos meses”. É o que lhe basta para ganhar tempo e, na medida do possível, tentar prolongar a encenação de combate à crise até que o Congresso, afinal, decida se a presidente deve ou não ser afastada.
Labirinto fiscal
Artigo de Míriam Leitão em O Globo, em 12/2/2016.
É melhor o governo dizer que não cumprirá de novo a meta deste ano, de 0,5% do PIB de superávit primário, e que nós estamos no terceiro ano de vermelho nas contas públicas. Quando anunciar os cortes no Orçamento, as equipes dos ministérios do Planejamento e Fazenda tentarão valorizar o que estão fazendo, mas o fato é que eles sabem que o Orçamento e a meta não serão cumpridos.
O governo se preparou para divulgar hoje o dado do corte. A ideia era deixar vazar algum número e depois anunciar um maior. Faz parte do ilusionismo governamental. Não deu certo a mágica porque eles se depararam com um quadro pior do que haviam imaginado. O governo se surpreende porque não quer encarar a realidade. A situação fiscal é totalmente anômala, e a soma da recessão com as decisões insanas tomadas por este governo é explosiva. O país precisa de muito mais ousadia e senso de urgência do que se tem em Brasília, onde a tendência da equipe econômica é se acomodar e fazer pequenos ajustes. A dívida pública vai superar os 80% do PIB em 2018. Isso significa que, ao fim do atual mandato, a dívida pública terá subido 30 pontos percentuais do PIB no governo Dilma. Isso é um aumento assustador. Será que ninguém olha números em Brasília?
A meta fiscal flexível é uma forma indireta de dizer que o Brasil terá déficit pelo terceiro ano. Ela só faria sentido se tivesse sido aplicada antes, para guardar o excesso de arrecadação do passado e induzir os estados e municípios a caminharem nesta direção. Agora, é licença para ficar no vermelho, que vai ser copiada obviamente por todas as instâncias administrativas.
Se uma firma ou uma família tem queda de receita, a solução nunca poderá ser uma licença para não cumprir os limites de despesas. Até porque se uma empresa — ou uma família — fizer isso, o preço a pagar será alto e depois de certo tempo os financiadores desaparecerão. Já o governo acha que pode fugir dessa regra geral, até porque vai elevar os impostos e taxas, como tem sido feito na esfera municipal, estadual e, principalmente, federal, para garantir seus gastos.
O contribuinte está exausto de pagar e de tomar susto a cada nova guia de imposto que chega para ser pago. E a alta da tributação não guarda qualquer relação com a qualidade dos serviços que piora a cada dia. Os administradores públicos foram imprevidentes e não se prepararam para o período de baixa e agora tentam assaltar o contribuinte para resolver seus problemas. Os governos estaduais tiveram, como informou o “Estadão”, 23% de aumento real de receitas em cinco anos. O Rio nadou em dinheiro com os royalties do petróleo. Agora, atrasa salário de funcionário público e os estados pedem a cada dia novas flexibilizações da Lei de Responsabilidade Fiscal. Não se prepararam para a queda de receita que de fato está acontecendo este ano.
O Orçamento da União é tão falso que ele depende de que sejam criados impostos que os contribuintes rejeitam, como a CPMF. Se ela não for aprovada até maio, haverá frustração de receita com a qual o governo contou no Orçamento enviado ao Congresso. E há a possibilidade de que ela sequer seja aprovada.
A presidente Dilma, no Congresso, falou em reforma da Previdência e disse que era para os próximos governos. Na verdade, o seu governo está mergulhando numa crise da Previdência cada vez maior. Em setembro do ano passado, o então ministro do Planejamento Nelson Barbosa fez uma apresentação projetando aumento do déficit do INSS de R$ 56 bilhões, em 2014, para R$ 88 bilhões, em 2015, e R$ 124 bilhões este ano. Isso, levando em conta projeção de crescimento de 0,2% no PIB deste ano, quando se sabe que haverá um recuo que pode chegar a 4%. O déficit da Previdência dos funcionários públicos está em R$ 65 bilhões.
Com tudo isso, a presidente, sem pressa, entrega para uma comissão, presidida pelo ministro Miguel Rosseto, a tarefa de propor uma reforma.
A última notícia que saiu é que será proposta, sim, a idade mínima de aposentadoria, mas para 2026. Tudo se passa como se o Brasil tivesse muito tempo ainda para resolver esta questão. A idade mínima foi proposta pelo ex-presidente Fernando Henrique em 1995, mas o que foi aprovado na Câmara foi totalmente desfigurado e por isso se criou o fator previdenciário. Isso foi há 20 anos. Agora o governo fala em mais 10 anos. A falta de noção de urgência no governo diante de uma crise é o que há de mais perigoso.

bruno

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