Nos EUA não há a menor preocupação com um golpe de Estado. Aqui é mais complicado.
Imagem: Google Imagens – Polibio Braga – brother
A invasão do Congresso norte-americano por bandos de militantes inconformados com o resultado das últimas eleições presidenciais é o resultado inevitável do tipo de ação política que faz mais sucesso hoje em dia em certos países. Essa ação se resume numa lei acima de qualquer outra: se o adversário ganha uma eleição, é preciso que ele seja destruído. Não dá para esperar até as próximas eleições e, no meio-tempo, fazer apenas oposição e mostrar aos eleitores que as suas ideias para o país são melhores? Não, não dá. Não existem mais ideias; só existe o “nós” contra “eles”, qualquer que seja o tipo de questão, e quem está do outro lado não deve ter o direito de existir.
Vai se tornando cada vez mais comum, e cada vez mais aceitável, a noção de que na vida pública não há propostas diferentes – há uma só, a sua, e quem estiver do outro lado é apenas o inimigo. Não pode ganhar as eleições para presidente. Se ganhar não pode assumir. Se assumir não pode governar. Se governar tem de vencer um pedido de impeachment por dia. Se vencer não pode se reeleger. A coisa não acaba mais.
Que seja assim em países onde as pessoas ainda vivem nas cavernas, até que dá para entender. Mas nos Estados Unidos? Não é lá que se pratica há 235 anos seguidos a melhor democracia do mundo, ou a menos pior? Não é de lá que a mídia, os professores de universidade e o Facebook baixam todo santo dia decretos dizendo o que é certo e o que é errado, ou como você tem de se comportar para levar uma vida virtuosa, civilizada e politicamente correta? Pois é. Alguma coisa deu horrivelmente errado. Badernas como a invasão do Capitólio, na opinião das elites americanas, têm de acontecer na América Latina, ou algum outro fim de mundo. Não lá.
Na verdade eles não sabem direito, nem se importam em saber, o que vem a ser isso – “América Latina”. Acham, vagamente, que América Latina é uma espécie de subúrbio de Puerto Rico, ou algo assim, e que os latino-americanos são um aglomerado de boçais primitivos que usam sombreiro, fazem siesta depois do almoço e são incapazes de entender a ideia de democracia. O Brasil, então, é alguma coisa ainda mais lamentável, com a agravante de que vive tocando fogo na Amazônia, caça índio à bala e pratica racismo “estrutural”.
Imaginem o que a imprensa e as classes intelectuais dos Estados Unidos estariam dizendo do Brasil se um negócio desses acontece aqui. A pedida mínima seria uma bomba de hidrogênio, seguida de um boicote comercial até o ano 3000. É ótimo, sem dúvida, que ninguém tenha invadido coisa nenhuma em Brasília. De qualquer forma, não é um bom sinal o jeito como a política está sendo praticada hoje em dia neste país. Nos Estados Unidos a invasão do Congresso acabou na hora em que chegou a polícia – e, apesar das repetidas manifestações de horror em relação ao episódio, não há a menor preocupação, não a sério, de que possa haver um golpe de Estado em Washington a curto prazo. Aqui já é mais complicado.
A maior parte da sociedade norte-americana, como a de qualquer país bem-sucedido economicamente, respeita de modo ativo e consciente, há muito tempo, as chamadas “instituições” – o Congresso, o Poder Judiciário, a Constituição, o império da lei e por aí afora. No Brasil não há respeito praticamente nenhum, porque as instituições não se comportam de maneira a serem respeitadas. Na verdade, seus atos comprovam, o tempo todo, que estão fazendo o exato contrário disso. A estima da população pelo Congresso Nacional é zero; pelo STF, então, periga ser ainda mais baixa. Se fecharem ambos, pouca gente vai perder cinco minutos de sono. É onde estamos.
José Roberto Guzzo, mais conhecido como J.R. Guzzo, é um jornalista brasileiro, colunista dos jornais O Estado de São Paulo, Gazeta do Povo e da Revista Oeste, publicação da qual integra também o conselho editorial.
José Roberto Guzzo, mais conhecido como J.R. Guzzo, é um jornalista brasileiro, colunista dos jornais O Estado de São Paulo, Gazeta do Povo e da Revista Oeste, publicação da qual integra também o conselho editorial.
Usamos cookies em nosso site para oferecer a você a experiência mais relevante, lembrando suas preferências e visitas repetidas. Ao clicar em “Aceitar tudo”, você concorda com o uso de TODOS os cookies. No entanto, você pode visitar "Configurações de cookies" para fornecer um consentimento controlado.
This website uses cookies to improve your experience while you navigate through the website. Out of these, the cookies that are categorized as necessary are stored on your browser as they are essential for the working of basic functionalities of the website. We also use third-party cookies that help us analyze and understand how you use this website. These cookies will be stored in your browser only with your consent. You also have the option to opt-out of these cookies. But opting out of some of these cookies may affect your browsing experience.
Necessary cookies are absolutely essential for the website to function properly. These cookies ensure basic functionalities and security features of the website, anonymously.
Cookie
Duração
Descrição
cookielawinfo-checkbox-analytics
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Analytics".
cookielawinfo-checkbox-functional
11 months
The cookie is set by GDPR cookie consent to record the user consent for the cookies in the category "Functional".
cookielawinfo-checkbox-necessary
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookies is used to store the user consent for the cookies in the category "Necessary".
cookielawinfo-checkbox-others
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Other.
cookielawinfo-checkbox-performance
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Performance".
viewed_cookie_policy
11 months
The cookie is set by the GDPR Cookie Consent plugin and is used to store whether or not user has consented to the use of cookies. It does not store any personal data.
Functional cookies help to perform certain functionalities like sharing the content of the website on social media platforms, collect feedbacks, and other third-party features.
Performance cookies are used to understand and analyze the key performance indexes of the website which helps in delivering a better user experience for the visitors.
Analytical cookies are used to understand how visitors interact with the website. These cookies help provide information on metrics the number of visitors, bounce rate, traffic source, etc.
Advertisement cookies are used to provide visitors with relevant ads and marketing campaigns. These cookies track visitors across websites and collect information to provide customized ads.