Nada como algumas perguntas simples e respostas sem complicação para se entender com rapidez a maior parte das coisas que aparecem no noticiário como se fossem o enigma do buraco negro do Universo. Essa história das transações entre um dos filhos do presidente e uma gigante do mundo das comunicações, por exemplo, que acaba de ressuscitar mais uma vez: está tudo 100% errado aí. É um alívio, realmente, diante de tantos mistérios da nossa vida pública, dar de cara com algo que qualquer um pode entender na hora – no caso, um embrulho onde não é possível encontrar nada de certo no começo, no meio e no fim.
Pode a empresa de um filho do presidente da República, conhecido como “Lulinha”, fazer algum tipo de negócio com uma empreiteira de obras públicas? Não pode. Podem, os dois, manter relações comerciais durante anos a fio? Não podem. Pode haver sociedade entre o filho e uma companhia que depende diretamente de atos do pai para sobreviver e prosperar? Não pode. Pode o presidente assinar um decreto que beneficia diretamente a empresa que é sócia do seu próprio filho? Não pode. Enfim: não pode nada, mas aconteceu tudo, no negócio montado entre Lulinha e a Oi/Telemar – Oi/Telemar, mas podem me chamar de Andrade Gutierrez.
Vista aérea do Sítio Santa Barbara, em Atibaia, no interior paulista, que foi alvode escrutínio do MPF em ação que acusou o ex-presidente Lula de receber propinas Foto: Marcio Fernandes/Estadão
É fato que entre 2004 e 2016 a Oi/Telemar pagou 132 milhões de reais à Gamecorp/Gol, a empresa do filho, por “serviços prestados”. É fato que não apareceu até agora nenhum motivo ou justificativa para que a primeira desse tanto dinheiro assim à segunda – que nunca teve ativos, talentos, funcionários, atividade empresarial ou qualquer outra coisa que pudesse valer, para a Oi, pagamentos de mais de 130 milhões de reais. É fato que um dos serviços prestados, constante de uma nota de 900.000 reais emitida em 2009, foi por “consultoria jurídica”. Como assim? A Gamecorp/Gol não era um escritório de advocacia – era apenas uma firma que fazia, segundo declarava o seu dono, “desenvolvimento e gestão de canais de distribuição de TV por assinatura” ou coisas desse tipo, todas elas em estado igualmente gasoso.
É fato, enfim, que em 2008 o presidente Lula assinou o decreto 6.654, dando à Oi/Telemar o direito de comprar a Brasil/Telecom. A compra não podia ser feita, pela lei – para isso, teria de haver, diretamente, um decreto presidencial de autorização. Resumo da peça, com pano “extremamente rápido”, como no “Teatro Corisco” de Millôr Fernandes: a Oi deu mais de 130 milhões de reais à Lulinha, e Lula assinou o papel que deu à Oi exatamente o que ela queria, e que só o presidente poderia dar. É isso o que aconteceu. O resto é metafísica, empulhação e conversa de advogado.
A Gamecorp/Gol, como é sabido, desapareceu da face da Terra sem deixar vestígio: só durou enquanto recebeu “aportes” e pagamentos da empreiteira-mãe. Quanto à própria Oi/Telemar, como também se sabe, a coisa toda acabou em lágrimas: a empresa está em “recuperação judicial” e seu presidente acaba de pedir demissão, assim que a justiça pediu novas investigações sobre o caso – que se julgava morto. “É só pepino”, explicou ele.
Resta, enfim, mais uma constatação de grande simplicidade: o silêncio da imprensa sobre histórias como essa faz o caso desaparecer do noticiário, mas não dos autos. A Justiça é um animal de comportamento imprevisível. Essa ou aquela história parecem sepultadas para sempre – mas de repente a tampa do túmulo se abre e saem de lá 47 mandados judiciais de busca e apreensão, a “fase 69” de uma investigação criminal e sabe-se lá quantos infortúnios a mais. A vida é dura.
José Roberto Guzzo, mais conhecido como J.R. Guzzo, é um jornalista brasileiro, colunista dos jornais O Estado de São Paulo, Gazeta do Povo e da Revista Oeste, publicação da qual integra também o conselho editorial.
José Roberto Guzzo, mais conhecido como J.R. Guzzo, é um jornalista brasileiro, colunista dos jornais O Estado de São Paulo, Gazeta do Povo e da Revista Oeste, publicação da qual integra também o conselho editorial.
Usamos cookies em nosso site para oferecer a você a experiência mais relevante, lembrando suas preferências e visitas repetidas. Ao clicar em “Aceitar tudo”, você concorda com o uso de TODOS os cookies. No entanto, você pode visitar "Configurações de cookies" para fornecer um consentimento controlado.
This website uses cookies to improve your experience while you navigate through the website. Out of these, the cookies that are categorized as necessary are stored on your browser as they are essential for the working of basic functionalities of the website. We also use third-party cookies that help us analyze and understand how you use this website. These cookies will be stored in your browser only with your consent. You also have the option to opt-out of these cookies. But opting out of some of these cookies may affect your browsing experience.
Necessary cookies are absolutely essential for the website to function properly. These cookies ensure basic functionalities and security features of the website, anonymously.
Cookie
Duração
Descrição
cookielawinfo-checkbox-analytics
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Analytics".
cookielawinfo-checkbox-functional
11 months
The cookie is set by GDPR cookie consent to record the user consent for the cookies in the category "Functional".
cookielawinfo-checkbox-necessary
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookies is used to store the user consent for the cookies in the category "Necessary".
cookielawinfo-checkbox-others
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Other.
cookielawinfo-checkbox-performance
11 months
This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Performance".
viewed_cookie_policy
11 months
The cookie is set by the GDPR Cookie Consent plugin and is used to store whether or not user has consented to the use of cookies. It does not store any personal data.
Functional cookies help to perform certain functionalities like sharing the content of the website on social media platforms, collect feedbacks, and other third-party features.
Performance cookies are used to understand and analyze the key performance indexes of the website which helps in delivering a better user experience for the visitors.
Analytical cookies are used to understand how visitors interact with the website. These cookies help provide information on metrics the number of visitors, bounce rate, traffic source, etc.
Advertisement cookies are used to provide visitors with relevant ads and marketing campaigns. These cookies track visitors across websites and collect information to provide customized ads.
1 Comentário