Deixe rastros em seu caminho. E permita que ele, por sua vez, entalhe suas marcas em você.
Mantenha um acervo de histórias em seu rosto e, principalmente, em sua alma.
Desavisados crerão que são apenas traços do tempo, esse tira malvado que nos espreita desde que nascemos.
Mas apenas você pode ter ciência de que cada entalhe em sua pele e espírito são, na verdade, testemunhos silenciosos mas eloquentes de todas as veredas percorridas até aqui.
São também cúmplices que auxiliam a enfrentar os temporais terrenos e os desassosegos interiores do dia a dia.
É neles que você pode se refugiar quando a noite parecer mais densa:
A canção do Dire Straits em uma madrugada de praia e lua em Paraty, “Portobello Belle”.
O sabor do bolo com guaraná caçulinha comidos aos oito anos na cozinha cheia de sombras acolhedoras da casa de sua tia.
O cheiro do café coado no pano nas manhãs frias, quando ainda havia manhãs frias no Rio, pela sua avó, para o seu avô, o dia nem bem nascendo.
Você e seu amor correndo do vento gelado, rindo, rindo, o guarda chuva se enfurnando atrás de você, da Nova York em abril, o chão um tapete de tulipas.
O choro de sua filha ao nascer se misturando ao seu.
Por todo bem que lhe é concedido seja grato, e até pelo que você não é e deveria ser.
Vocês podem dizer que isso é apenas envelhecer.
Eu digo que todos somos guardiões de histórias:
Que ainda estão sendo gravadas centímetro por centímetro em nossas faces.
Professor e historiador como profissão – mas um cara que escreve com (o) paixão.