Lembro até hoje a primeira vez que vi Ney Matogrosso.
Foi num domingo à noite. No “Fantástico”, claro.
Em 1974. Eu tinha 9 anos.
O primeiro impacto foi a voz. O segundo a letra, aquela deliciosa mistura de folclore brasileiro com europeu, sacis, fadas e lobisomens.
Finalmente levantei a cabeça para a TV, preto e branco, e sofri o impacto da imagem.
Quem eram aqueles seres, com o rosto pintado como atores de Kabuki, o teatro japonês?
Só muitos anos mais tarde pude compreender o verdadeiro alcance da mensagem dos Secos e Molhados – a banda original de Ney.
Com sua mistura singular de ritmos e sons, e vertendo para a música poemas de autores geniais como Mário Quintana, Júlio Cortazar, Cassiano Ricardo e Fernando Pessoa, os Secos e Molhados abriram uma estrada única para a música no Brasil – e essa estrada não tem movimento até hoje. Infelizmente.
Infelizmente também, os S&M duraram pouco.
O bom é que deles emergiu Ney, que manteve a herança da banda no cuidado com as composições, letra e música.
Mas penso que seu legado maior, em que pese sua riqueza como artista, é algo que não se define em partituras e cifras.
Eu falo de respeito, a si próprio e ao público.
Quando vejo Ney, hoje, no alto de seus 80 anos, completos ontem, uma palavra me vem à mente, cintilando em neon. Dignidade. Claro.
Ney já foi estrela: hoje, virou Regulus, o rei, o astro mais brilhante da constelação de Leão – não por acaso, signo dele.
Continue a lumiar.
Que seja sempre luminar.
Parabéns, Ney. (Texto: Joseph Agamol )
Professor e historiador como profissão – mas um cara que escreve com (o) paixão.