Na noite passada, participei de um debate na tevê. Minha função não era a de debatedor, mas a de fazer algumas perguntas.
Participaram dois ex-ministros da Saúde, Luis Henrique Mandetta e Humberto Costa. Além deles, Osmar Terra, ex-ministro da Cidadania e ex-secretário da Saúde no Rio Grande do Sul.
Osmar Terra é alinhado com Bolsonaro. Sua posição é de negar a utilidade do isolamento social. Ele afirma que o isolamento de nada valeu pois morreram dez mil pessoas. Afirma mais ainda: o que torna o vírus perigoso é ficar em casa.
É uma forma de negar a importância das táticas que têm salvado vidas. Tenho uma boa relação com ele. Na verdade, devo-lhe um favor. Quando secretário no Rio Grande a Unesco desenvolvia um programa com mães pobres. O programa consistia em prepará-las para estimular a inteligência e o reflexo dos filhos, para que não chegassem à escolar sem condições de seguir o ritmo dos outros.
Minha filha, Tami, estava concluindo o curso de psicologia e pedi que deixassem ela fazer uma visita ao programa para aprender com ele. Osmar foi gentil e cedeu.
No momento, entretanto, ele defende posições que me parecem fora da realidade. São posições que não só negam o valor do isolamento mas também subestimam o vírus, comparando-se com outras epidemias.
São teses feitas sob medida para fundamentar a irresponsabilidade de Bolsonaro.
Terra afirma que grande parte dos americanos contraiu o vírus dentro de casa, logo o isolamento é perigoso. Procurei mostrar que esses números que se referem a dentro de casa mencionam também os asilos, 26 mil pessoas morreram nos asilos norte-americanos, cerca de um terço das 76 mil mortes naquele país.
O interessante é que ele sabe muito bem que o vírus não entra por debaixo da porta ou pela janela aberta. O vírus, de um modo geral, é passado de pessoa a pessoa ou em alguns objetos em que se deposita.
Quando você pergunta como as pessoas isoladas contraíram o vírus, ele não tem outra resposta exceto admitir que foi trazido da rua. Logo é inevitável admitir que a atividade social, no momento, o centro do perigo.
Muita gente acha que sou calmo demais nessas discussões. Estou acostumado a discutir contra teses estapafúrdias. Na verdade, com muito orgulho, posso dizer que até com loucos me entendo muito bem.
No livro O Que é Isso Companheiro relato uma experiência de cadeia, no distrito de Ricardo Albuquerque. Um louco tentava ruidosamente estacionar um caminhão hipotético na sua cela e não nos deixava dormir. Ele gritava ordens para um motorista inexistente.
A única maneira de recuperar o silêncio era ajudá-lo a estacionar o caminhão e o fizemos aos gritos, até que finalmente o veiculo imaginário encostou.
No caso específico da negação da importância do coronavírus existe uma base de debate que nos ensinou muito: a discussão com os que negam o aquecimento global.
Mandetta percebeu bem que o caminho dos negacionistas não apenas diminuir a importância do vírus, tratando-o como uma gripezinha.
Sua meta também é negar a importância das vacinas. Mandetta perguntou se quando aparecer a vacina vão dispensá-la.
Observo hoje lendo o New York Times que faz sucesso entre os apoiadores de Trump que negam o coronavírus as teses de uma cientista ligada a eles, cujo nome é Judy Mikovits.
Sua tese é a de que o coronavírus é tão perigoso porque as pessoas foram vacinadas e esse processo serviu para enfraquecer sua resistência e abrir caminho para o poder de homens como Bill Gates.
Pura teoria conspiratória que se articula também com a ideia de que o coronavírus é um produto das torres de telefone celular ou da tecnologia 5D.
Faz parte da luta contra o coronavírus combater essas teses malucas, embora seja realmente uma pena ter de gastar energia com isso.
Tanto nos Estados Unidos como no Brasil, Bolsonaro já manifestou isso, a negativa do vírus se estende à contagem dos mortos. Os grupos de extrema direita acham que estão superestimados, enquanto a maioria dos sanitaristas acham que há subnotificação.
No caso brasileiro, a subnotificação parece evidente pelo número de mortes por doenças respiratórias e mortes em casa. Esses índices aumentaram muito em 2020.
Sou muito tranquilo para discutir tudo isso porque sigo o curso do novo coronavírus desde quando surgiu em Wuhan. Passei o carnaval debruçado nos números na Itália, onde a crise estava chegando ao auge na Lombardia.
Mesmo essa acusação de que só damos notícias ruins, no meu caso não cola. Todas as semanas falo de novidades sobre vacina, antivirais e testes.
É uma luta longa, sem balas de prata à vista. É preciso muita paciência.
O que é difícil engolir é um presidente passear de jet ski num dia de luto nacional pela morte de 10 mil pessoas no Brasil. Ou mesmo bolsonaristas encenarem um deboche, sábado, sobre os mortos do coronavírus como este que está circulando na internet.
Ainda assim prosseguimos pois há 75 anos terminava a II Guerra, também cheia de horrores, para não falar da Primeira Guerra, da crise de 29 e todos os outros momentos difíceis que viveram nossos antepassados.
Fonte: Blog do Gabeira
Participaram dois ex-ministros da Saúde, Luis Henrique Mandetta e Humberto Costa. Além deles, Osmar Terra, ex-ministro da Cidadania e ex-secretário da Saúde no Rio Grande do Sul.
Osmar Terra é alinhado com Bolsonaro. Sua posição é de negar a utilidade do isolamento social. Ele afirma que o isolamento de nada valeu pois morreram dez mil pessoas. Afirma mais ainda: o que torna o vírus perigoso é ficar em casa.
É uma forma de negar a importância das táticas que têm salvado vidas. Tenho uma boa relação com ele. Na verdade, devo-lhe um favor. Quando secretário no Rio Grande a Unesco desenvolvia um programa com mães pobres. O programa consistia em prepará-las para estimular a inteligência e o reflexo dos filhos, para que não chegassem à escolar sem condições de seguir o ritmo dos outros.
Minha filha, Tami, estava concluindo o curso de psicologia e pedi que deixassem ela fazer uma visita ao programa para aprender com ele. Osmar foi gentil e cedeu.
No momento, entretanto, ele defende posições que me parecem fora da realidade. São posições que não só negam o valor do isolamento mas também subestimam o vírus, comparando-se com outras epidemias.
São teses feitas sob medida para fundamentar a irresponsabilidade de Bolsonaro.
Terra afirma que grande parte dos americanos contraiu o vírus dentro de casa, logo o isolamento é perigoso. Procurei mostrar que esses números que se referem a dentro de casa mencionam também os asilos, 26 mil pessoas morreram nos asilos norte-americanos, cerca de um terço das 76 mil mortes naquele país.
O interessante é que ele sabe muito bem que o vírus não entra por debaixo da porta ou pela janela aberta. O vírus, de um modo geral, é passado de pessoa a pessoa ou em alguns objetos em que se deposita.
Quando você pergunta como as pessoas isoladas contraíram o vírus, ele não tem outra resposta exceto admitir que foi trazido da rua. Logo é inevitável admitir que a atividade social, no momento, o centro do perigo.
Muita gente acha que sou calmo demais nessas discussões. Estou acostumado a discutir contra teses estapafúrdias. Na verdade, com muito orgulho, posso dizer que até com loucos me entendo muito bem.
No livro O Que é Isso Companheiro relato uma experiência de cadeia, no distrito de Ricardo Albuquerque. Um louco tentava ruidosamente estacionar um caminhão hipotético na sua cela e não nos deixava dormir. Ele gritava ordens para um motorista inexistente.
A única maneira de recuperar o silêncio era ajudá-lo a estacionar o caminhão e o fizemos aos gritos, até que finalmente o veiculo imaginário encostou.
No caso específico da negação da importância do coronavírus existe uma base de debate que nos ensinou muito: a discussão com os que negam o aquecimento global.
Mandetta percebeu bem que o caminho dos negacionistas não apenas diminuir a importância do vírus, tratando-o como uma gripezinha.
Sua meta também é negar a importância das vacinas. Mandetta perguntou se quando aparecer a vacina vão dispensá-la.
Observo hoje lendo o New York Times que faz sucesso entre os apoiadores de Trump que negam o coronavírus as teses de uma cientista ligada a eles, cujo nome é Judy Mikovits.
Sua tese é a de que o coronavírus é tão perigoso porque as pessoas foram vacinadas e esse processo serviu para enfraquecer sua resistência e abrir caminho para o poder de homens como Bill Gates.
Pura teoria conspiratória que se articula também com a ideia de que o coronavírus é um produto das torres de telefone celular ou da tecnologia 5D.
Faz parte da luta contra o coronavírus combater essas teses malucas, embora seja realmente uma pena ter de gastar energia com isso.
Tanto nos Estados Unidos como no Brasil, Bolsonaro já manifestou isso, a negativa do vírus se estende à contagem dos mortos. Os grupos de extrema direita acham que estão superestimados, enquanto a maioria dos sanitaristas acham que há subnotificação.
No caso brasileiro, a subnotificação parece evidente pelo número de mortes por doenças respiratórias e mortes em casa. Esses índices aumentaram muito em 2020.
Sou muito tranquilo para discutir tudo isso porque sigo o curso do novo coronavírus desde quando surgiu em Wuhan. Passei o carnaval debruçado nos números na Itália, onde a crise estava chegando ao auge na Lombardia.
Mesmo essa acusação de que só damos notícias ruins, no meu caso não cola. Todas as semanas falo de novidades sobre vacina, antivirais e testes.
É uma luta longa, sem balas de prata à vista. É preciso muita paciência.
O que é difícil engolir é um presidente passear de jet ski num dia de luto nacional pela morte de 10 mil pessoas no Brasil. Ou mesmo bolsonaristas encenarem um deboche, sábado, sobre os mortos do coronavírus como este que está circulando na internet.
Ainda assim prosseguimos pois há 75 anos terminava a II Guerra, também cheia de horrores, para não falar da Primeira Guerra, da crise de 29 e todos os outros momentos difíceis que viveram nossos antepassados.
Fonte: Blog do Gabeira