21 de janeiro de 2025
Fernando Fabbrini

Damas da palavra

Graça, inteligência e elegância nos lábios das mulheres

Na condição de um homem que ganha a vida escrevendo todo tipo de coisa, confesso uma frustração: a de nunca ter assinado um único para-choque de caminhão. Seria uma honra ler alguma frase de minha autoria pintada na traseira de uma carreta, algo como “Levo o Scania no braço e a Jéssica no coração”. Desde que o caminhoneiro não fizesse a besteira de inverter os advérbios, estaria aí minha contribuição para uma longa quilometragem de amor sincero.

Fechada a possibilidade, dediquei-me a colecionar frases inteligentes e irônicas porque conceber, gerar e dar à luz a uma sentença que vai além do mero sentido das palavras é um privilégio feminino incomparável. À primeira vista se assemelham a frases comuns, inofensivas. Aí você dá a mordida e lá está a azeitona, a moral da história, a lição sutil. Grande arte, essa de rechear sentenças. Então, como um pequeno presente aos meus leitores – sobretudo às leitoras – revelo aqui alguns desses tesouros que me inspiram enquanto batuco os dedos no teclado.

Vicki Baum, por exemplo, foi uma fantástica austríaca de origem judaica. Além de escrever romances celebrados como “Pessoas num Hotel”, livro que virou filme e ganhou um Oscar em 1932, Vicki era roteirista, jornalista, tocava harpa e…. lutava boxe. Talvez entre um assalto e outro, no toque do gongo, cuspiu sangue para o lado e disse: “O pior sentimento que se pode oferecer a uma mulher é a piedade”.

Na literatura, sou fã de duas Marguerites das quais já li quase tudo: a belga Yourcenar, da obra-prima “Memórias de Adriano” e a francesa Duras, roteirista do magistral clássico do cinema “Hiroshima, meu amor”. A primeira falou e disse: “É um erro ter razão cedo demais”. Uau! Duras, que nos anos 1960 abriu seu caminho profissional na marra, não deixou barato: “Os homens adoram as mulheres que escrevem – mesmo que não o admitam”.

Outra baita novelista, a norte-americana Kathleen Norris, legou ao mundo feminino um alerta bem-humorado: “Trocar de marido é só trocar de encrenca”. Hellen Keller – cega e surda – tornou-se uma palestrante e escritora mundialmente aplaudida e referência na defesa das pessoas com deficiências. É dela o contundente “Para fazer brilhar sua estrela você não precisa apagar a de alguém”. Tomaram, vaidosos?

Mulheres brasileiras também são mestras em tiradas certeiras. Saudades do charme e da ousadia de Leila Diniz, que não tinha papas na língua e isso a fazia ainda mais fascinante. Ela advertiu: “Os artistas mais cafajestes que conheci eram uns anjos de pessoas” reforçando o dito popular “talento não escolhe caráter”. Clarice Lispector não tremeu diante das grandes interrogações da vida: “Com todo perdão da palavra, eu sou um mistério para mim”.

Nós também, cara Clarice – mas tem gente que vive no automático e nem dá bola para tal mistério cotidiano.
Muitas mulheres em cargos de destaque – principalmente na área da política – também são hábeis na criação de frases memoráveis. Margareth Thatcher foi uma dessas. “O socialismo é um sistema que dura até acabar o dinheiro dos outros”. Esta serve como um soco inglês no queixo do Brasil, onde desperdiçar a rodo dinheiro público – aliás, o nosso – voltou à moda nesse governo.

Falando sobre ditos femininos, semana passada – durante mais um desses esbanjamentos populistas que nos custou R$ 30 milhões – aquela senhora envergonhou-nos outra vez, soltando palavrão que só soou empoderado para a costumeira minguada plateia.

Na hora, lembrei-me novamente de Thatcher e de outra sentença de sua lavra: “Ser poderoso é como ser uma dama. Se você precisa dizer às pessoas que você é, você não é.”

Fernando Fabbrini

Escritor e colunista de O TEMPO

Escritor e colunista de O TEMPO

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