19 de abril de 2024
Adriano de Aquino Colunistas

Um levante auspicioso

Foi com essa argumentação que convenci à Lynne que eu não era a companhia ideal para acompanhá-la nessa tarde  de convencional e brochante turismo cultural pós-moderno.

Então, ela sugeriu que a acompanhasse  à uma galeria do quartier para visitar a exposição ‘L’Art de la Aprpropiation’. Meu interesse era zero. Mas, para não frustá-la mais uma vez, cedi.

A exposição consistia na montagem de uma serie de obras do que hoje se convencionou chamar de ‘appropriationisme”, o mais recente estilo já convenientemente aplicado ao mercado e nas escolas de arte. Nada que valha a pena relatar. Lynne é uma mulher envolvida no negócio da arte. Uma competente profissional. Como artista e amigo, sou seu parceiro de longa data.

Poucos comentários de ambas as partes, nos dirigimos, então,  para o Grand Palais, para ver a mostra do Hokusai. Porém, a  terceira  tentativa de visitar esta  exposição que desejávamos ver,  foi novamente frustrada. Uma fila enorme de japoneses obstinados em prestigiar o grande mestre, somada a chuva fina e o vento frio, acabaram por quebrar nossa resistência.

De volta a estação La Muette, seguimos para visitar a exposição “Impression,Soleil Levant”. Nesta estadia visitei essa mostra umas quatro vezes.

Mesmo não sendo a mostra de maior destaque na agenda  cultural parisiense deste dezembro, eu havia anotado essa visita como obrigatória antes mesmo de sair do Rio.

Primeiro por conta do museu. O Marmottan é meu museu preferido desde o tempo de estudante em Paris. Segundo, porque a proposta da mostra de abordar a verdadeira história do “chef-d’oeuvre” de Claude Monet, me pareceu um desafio a conferir. Sobretudo, tendo em vista que a primeira grande historia do impressionismo, escrita por John Rewald e publicada nos anos 50, que apontava essa obra como o ícone do Impressionismo e titulo  que deu origem ao nome desse  estilo, ao contrario das suposições que indicavam a pintura intitulada “La Gare de Saint-Lazare”- também de Monet- como a gênese desse movimento artístico.

Comprovei mais uma vez como um trabalho de curadoria criteriosa define uma museografia correta capaz de tornar uma visita a um museu uma experiência intensa entre o visitante e o tema proposto, entre obra e espectador.

A iluminação adequada e perfeita para falar a verdade-integrada a uma museografia discreta e elegante empenhada em destacar pontos convergentes entre as obras expostas e enfatizar a busca incansável do artista pela luz e contra planos que marcam a poética profundidade pictórica de Monet, fazem dessa mostra um delicado estudo sobre a pintura e elevam o visitante em uma experiência sensível e emocionante conduzida por um trabalho curatorial serio e dedicado, desprovido de vaidades supostamente autorais.

O desafio da curadoria é ainda maior tendo em vista que ao sair dessa mostra o visitante desce dois lances de escada e mergulha nas profundezas das ‘nynfeas’ que pertencem a coleção nacional de arte, agora, definitivamente instalada no museu Marmottan Monet.

Só a titulo de curiosidade colo aqui uma citação critica contra a histórica exposição de 1874, intitulada “L’impression” (soleil levant sur la Tamise) que consta do catálogo desta exposição:”…la impression de Lever le soleil est traitée par la main enfantine d’un ecolier qui etale pour la premiere fois des couleurs sur un surface quelconque…>>

Na versão literal em português: ” A pintuira Soleil Levant  é processada pela mão infantil de um colegial que pela primeira vez espalha cores em qualquer superfície”  Marc de Montifaud,L’Artiste,, inserida no catálogo de forma a nos dizer que os ponto de vista de  críticos e intelectuais do oficialato cultural de uma época, se dissolvem no ar como opiniões fugazes e ínsiptas, contra ou a favor.

As grandes obras transcendem o tempo.

Ainda que a opinião do critico de então não tenha correspondência direta com meu comentário sobre o show do Koons, o assunto não deixa de ser engraçado dado que, hoje, o marketing e a mídia cultural em consonância com as politicas institucionais, valorizam ao extremo  a projeção econômica de alguns produtos artísticos,  com  ênfase no sucesso  pessoal e na  economia do espetáculo, itens alheios a verdadeira  polêmica que perpassa o ambiente artístico dos nossos dias.

Enfim, esses fatores, juntos e misturados, são o inverso  de Marc de Montifaud,, mas, como ele, tendem a figurar na história de forma semelhante.

Saímos satisfeitos e fomos nos deliciar com uma boa refeição e um papo substancioso no Pure Café.

O Boletim

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