16 de abril de 2024
Adriano de Aquino Colunistas

Meu “primeiro dia”…

Hoje é o primeiro dia, após longa temporada digitando no laptop posicionado abaixo do cotovelo, que sentei diante do PC para digitar na confortável posição acima do cotovelo apoiado na cadeira.

Amanhã é dia de mais uma fisioterapia. Aos poucos o cirurgião e a terapeuta estão me liberando para atividades de gente normal.

Creio que assim que for liberado para retornar ao ateliê, as longas historinhas que compartilho na comunidade virtual irão para segundo plano.

Enquanto isso não acontece, contarei mais algumas.

Antes farei um esclarecimento. Sou grato aos amigos que curtem, leem e comentam meus longos textos. É um estimulo. Sobretudo porque adotei um método mix de hipertexto e feedbacks dos comentários dos amigos que leio com muita atenção, para seguir adiante.

Tendo em vista que muitos comentários feitos carecem de informações precisas da minha parte quanto ao ano exato da narrativa e nomes dos personagens, tentarei preencher essa lacuna na historia de hoje.

Nomes, não citarei.

Porém, informo que essa historia aconteceu entre 1964 e 1968, quando ainda morava na casa dos meus pais na rua Afrânio de Mello Franco, 80.

Para situar o leitor que não viveu esse tempo, ou não é dessa cidade, informo que no fim desta rua, na direção da Lagoa Rodrigo de Freitas, onde hoje existe um conjunto de prédios apelidado de Selva de Pedra, situava-se a Favela da Praia do Pinto. Um pouco acima em direção à praia, haviam casas e edifícios residenciais onde habitava gente da classe média.

Mais próximo à praia, casas de gente rica, residências consulares, de banqueiros e grandes empresários.

Nesse território eclético – no fim da rua um gueto. Junto ao mar a riqueza – espremido entre o mar e a Lagoa, morou um presidente da republica, dois governadores de estado, diretores de bancos e altas patentes militares.

Foi nesse lugar que o plebeu que vos fala passou a infância e juventude.

A nossa república juvenil era até certo ponto fechada. Porém, tolerante a estranhos quando chegavam a nós com o aval de um companheiro.

Foi numa dessas aberturas que através de uma amiga da elite dessa rua, conheci na praia a ‘princesa do Cosme Velho’ e seu amigo monarquista.
Não fosse a beleza e o encanto da princesa eu, como republicano, não daria a menor pelota para o monarquista aspirante a diplomata.

Levei pouco tempo para entender que o monarquista tinha outras preferências, bem diferentes da minha sob vários aspectos. Quando percebi, a coisa andou bem, ele se tornou um embaixador para me aproximar da princesa.

Nossa amizade foi a ponte para penetrar nos domínios da princesa. O monarquista passou a ir com frequência na minha casa. Tornou-se habitue. Fez amizade com meus irmãos e se enturmou na turma republicana.

Ele morava no Posto Seis, num apartamento de dois quartos com a mãe viúva, aposentada do Banco do Brasil.

Era um apartamento modesto. Porém, seu quarto era um luxo. Uma réplica de uma acomodação imperial. Apinhado, do chão ao teto, com gravuras de cenas equestres da nobreza inglesa. Cenas das cortes europeias, gravuras de época de D. Pedro II e mobiliário colonial.

Enfim,o ambiente cultural da sua preferência eram os antiquários. Ele não tinha muita simpatia pelos modernos mas cultuava as fofocas da alta roda. Se entusiasmava quando sabia de uma fofoca do Country Clube que circulava entre os amigos do enclave mais rico da Afrânio. Queria saber tudo.Nomes, sobrenomes dos envolvidos . Quando sabia, desenrolava a arvore genealógica da grã-fina que caiu na boca do povo.

Foi através dele que fui convidado para uma festa nos domínios da princesa. Foi ali, naquele baile, que a empatia entre a princesa e eu subiu um degrau. Esquentou!

Ficamos mais próximos e, por conta da sua esperta intenção, fui convidado para um almoço em família. Só os quatro na mansão.

O pai, um rico e poderoso executivo de uma multinacional. A mãe, uma doce criatura que mantinha a classe, discrição e elegância da sua família nórdica. Era sensível e inteligente.

Foi essa mãe, doce e gentil, que permitiu ou melhor; autorizou maior proximidade da filha comigo.

Aconteceu assim. Após o almoço seguimos para o jardim para tomar café e papear. Num ponto da conversa o pai dela perguntou para mim o que eu estava estudando.

Eu mesmo! Respondi de chofre.

A doce mãe olhou fixamente para mim, esboçou um sorriso e, desde então, me tornei um jovem confiável.

A princesa não precisava mais dizer que ia passar o fim de semana na casa da amiga no Leblon. Foi liberada.

Fui várias vezes convidado para a casa de campo em Itaipava.

A princesa pôde então exibir livremente seus dotes e desejos que podiam, depois de umas doses a mais, subitamente explodir no banco de trás de um velho taxi preto, no retorno de uma festa.

Adriano de Aquino

Artista visual. Participou da exposição Opinião 65 MAM/RJ. Propostas 66 São Paulo, sala especial "Em Busca da Essência" Bienal de São Paulo e diversas exposições individuais no Brasil e no exterior. Foi diretor dos Museus da FUNARJ, Secretário de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, diretor do Instituto Nacional de Artes Plásticas /FUNARTE e outras atividades de gestão pública em política cultural.

Artista visual. Participou da exposição Opinião 65 MAM/RJ. Propostas 66 São Paulo, sala especial "Em Busca da Essência" Bienal de São Paulo e diversas exposições individuais no Brasil e no exterior. Foi diretor dos Museus da FUNARJ, Secretário de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, diretor do Instituto Nacional de Artes Plásticas /FUNARTE e outras atividades de gestão pública em política cultural.

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