Eu era garoto ainda, no Rio de Janeiro oitentista, quando ouvi pela primeira vez “Time”, do Pink Floyd, uma obra-prima dentro de outra obra-prima: o disco “The Dark Side of the Moon”.
Meu inglês precário, à época, até me permitiria compreender os versos nada herméticos da canção – mas eu era um roqueirinho aprendiz de guitar-hero, e fora seduzido pelos atributos musicais de “Time”: um rock vigoroso e envolvente, a voz catártica do guitarrista David Gilmour, e o magnífico e melódico solo de guitarra, a joia da coroa da composição.
Mas, ainda que eu tivesse encontrado um tempo – ops! – em minha doce rotina de estudante do Segundo Grau (era chamado assim à época: mudam os nomes e a educação só piora) do Colégio Estadual João Alfredo, sito à avenida 28 de Setembro, em Vila Isabel, e que consistia em matar o tempo – ops de novo ! – jogando vôlei em uma das três quadras da escola, fugir dos inspetores e observar o vai-e-vem das normalistas, o garoto de 17 anos que eu era não compreenderia a corrosiva crueldade, a doce melancolia – e a implacável verdade contida em seus versos:
“Você gasta descuidadamente as horas
Esperando que alguém ou algo lhe mostre o caminho…
Você é jovem e acha que a vida é longa,
Mas um dia você descobre que dez anos ficaram para trás
Você perdeu o tiro de largada.
Agora, você corre para alcançar o sol,
Mas ele está se pondo,
E dá a volta para ficar sempre atrás de você.
O sol é o mesmo mas você está mais velho,
Cada ano que passa fica mais curto
E você parece com cada vez menos tempo
Para planos que, afinal, deram em nada…”
Eu tinha só dezessete anos, repito, mas, mesmo que alguém tivesse me alertado que o sr. Tempo é um tira malvado, como bem definiu Stephen King, e que, já àquela época, estava rondando perto de mim, eu não teria dado atenção. Estava por demais ocupado fritando as horas, vocês sabem como é: também tiveram dezessete anos.
Hoje eu sei que ninguém, a partir de uma certa maturidade, fica imune à canção tão e seus versos simples, mas tão duros e tão inexoráveis – como o próprio Tempo.
Eu escrevi esse texto em uns 15 minutos, nos intervalos da minha série na academia. Por vezes tive a impressão de ver fugazmente o sr. Tempo, através do espelho. Mas provavelmente era só eu mesmo – me esgueirando de mim.
Professor e historiador como profissão – mas um cara que escreve com (o) paixão.