29 de março de 2024
Walter Navarro

1 Hambúrguer + 1 Hambúrguer = 2 Hambúrgueres


E não é que as “louras burras” existem?
Nada mais triste que explicar uma piada, duas, três vezes. E ainda assim, é preciso explicar de novo, desenhar.
Nada mais patético que explicar piada, brincadeira, metáforas e o pior: ironia.
E o mais hilário é a pessoa que não entende fazer outra piada, claro, fácil e sem graça.
Até criaturas que eu julgava ligeiramente íntimas do pensamento deixaram as máscaras no chão.
O problema, percebo, não é Eduardo Bolsonaro pleitear a vaga de embaixador nos Estados Unidos, mas dizer que fritou hambúrguer.
Choveram comparações “engraçadíssimas”, do tipo Aécio Neves embaixador na Colômbia…
Fritar sardinha e ser embaixador em Portugal…
Fritar pastel e ser embaixador na China…
Quanto humor inteligente! Não paro de rir! E aviso: isso é uma brincadeira, ironia, OK?
Hoje, em O Globo, Ancelmo Gois, cujo domínio da língua começa pelo próprio nome, desenterrou até o avô de Aécio, Tancredo Neves, contando outra anedota engraçadíssima…
Um correligionário de Tancredo teria pedido emprego para um sobrinho que falava inglês. Tancredo respondeu: “Meu filho, espero que ele tenha outros atributos, porque falar inglês, até porteiro de hotel de Copacabana fala”.
Não, Tancredo. Não, Anselmo, perdão, Ancelmo. Um dos maiores problemas do Turismo no Brasil é que ninguém fala inglês; às vezes, nem o português.
Em Paris, se o cara não sabe falar inglês, nem garçom, em lugar turístico, ele pode ser.
Em Amsterdã, até motoristas de ônibus devem falar inglês.
Até os ingleses, com ou sem Brexit, falam inglês. Outra brincadeira, tá?
Então, lá vai o Walter Navarro, explicar aos ímpios, mais uma vez, o tão temido e ululante óbvio de Nelson Rodrigues, o inimigo número 1 da Burrice.
Já ouviram falar na Rússia e de um escritor chamado Leon Tolstoi?
Tolstoi escreveu esta sabedoria: “Para ser universal, basta cantar o seu quintal”. Entenderam? Não? OK. Vamos desenhar com as cores de Marc Chagall.
Conhecem Chagall?
Marc Chagall era “vizinho” de Tolstoi. Nasceu num vilarejo da Bielorrússia, em 1887.
Poupem-me de explicar a Bielorrússia que, em 1887, pertencia ao Império Russo, please.
Chagall era judeu e morreu francês, aos 98 anos.
Recentemente vi um documentário sobre Chagall e percebi que, até o fim de sua longa e colorida vida, ele se expressava mal em francês. É de sua lavra, o imenso forro/teto da Ópera Garnier, em Paris. 220 m² que pintou em 1964, aos 77 anos.
Mil obras e um ano depois, Chagall pintou também os murais do Metropolitan Opera House de Nova York.
Pois bem. Seguindo, sem querer ou saber, o ensinamento de Tolstoi; em telas, tetos ou murais, Chagall pintou eternamente sua pequena aldeia na Bielorrússia.
Há muito de sua pequena Brodowski (SP), nos gigantescos painéis, de “Guerra e Paz”, que Portinari pintou para a sede da ONU, em 1956.
O que têm a ver Eduardo Bolsonaro, Chagall e Portinari? Aparentemente, nada, no final das contas, tudo.
Freud dizia que, às vezes, um charuto é apenas um charuto (e não um símbolo fálico, um desejo secreto de chupar pau).
O belga Magritte pintou um cachimbo e explicou abaixo: “Ceci n’est pas une pipe” ou “isso não é um cachimbo”. Aliás, “faire une pipe”, em francês, quer dizer, “fazer sexo oral, pagar um boquete (no homem)”.
Às vezes, fritar um hambúrguer não é apenas fritar um hambúrguer. É, no caso dos Estados Unidos, o próprio “american way of life”.
Quando Eduardo Bolsonaro alegou intercâmbio e fritar hambúrguer como credenciais, ele quis dizer que conhece bem os Estados Unidos.
Muitos sábios críticos de Eduardo Bolsonaro sequer saíram do Brasil. Nunca fizeram intercâmbio e só conhecem hambúrguer no McDonald’s.
Por trás de um vulgar fritar de hambúrguer pode, ou não, existir um grande conhecimento dos Estados Unidos.
Às vezes quem sabe fritar um hambúrguer, fazer um cachorro-quente, sabe muito mais dos Estados Unidos. Muito mais do que quem conhece George Washington ou acha que os Estados Unidos são um enorme shopping center.
Mais que nos livros, cinema e música, conheci a França entregando jornais a pé e almoços numa lambreta; colando cartazes e cuidando de uma deficiente; distribuindo “Bonjour” a caixas de supermercado e em bancas de revista; bebendo vinho e andando sozinho nas madrugadas de Paris sem metrô; arquivando papéis velhos e limpando túmulos.
Vocês sabem fazer pizza inglesa? Eu sei. Aprendi cortando os dedos em Londres.
E conheço um pouco do almirante Nelson e do general Napoleão Bonaparte.
PS: “Tenho inveja da Burrice porque ela é como a Pedra da Gávea: eterna”. (Nelson, não o almirante, mas o Rodrigues).

Walter Navarro

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

Jornalista, escritor, escreveu no Jornal O Tempo e já publicou dois livros.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *