28 de março de 2024
Sergio Vaz

Ou a Luz, ou as Trevas


É dessa escolha que se trata. Não só no Brasil, mas no Planeta todo.
Que os conceitos de esquerda e direita são hoje vagos, imprecisos, disso pouca gente pensante tem dúvida. Criados logo após a Revolução Francesa de 1789, com base na posição em que se sentavam girondinos e jacobinos na Assembleia Nacional, eles vieram sendo arranhados, amarfanhados, desbotados ao longo destes 230 anos de História.
Claro que se trata de loucura absoluta, insanidade pura e simples, afirmar – como fez o atual presidente da República Federativa do Brasil – que o nazismo foi uma ideologia de esquerda. Mas a verdade dos fatos é que não há diferenças básicas entre os campos de concentração do nazismo e os Gulags, os campos de internação dos dissidentes do regime soviético na Sibéria, ou os campos de treinamento e reabilitação da República Popular da China, seja nos tempos radicais da Revolução Cultural de Mao, seja agora, na capitalistíssima mesma China.
De maneira semelhante, são muito óbvias as semelhanças entre os regimes socialistas dos Castros em Cuba e de Chávez & Maduro na Venezuela e aqueles dos generais direitistas que assolaram nos anos 60 e 70 diversos países da América do Sul – Brasil, Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai. Em todos eles vigorava e/ou vigora dura censura à imprensa e opositores do regime eram e/ou são presos a bel prazer das autoridades de plantão. Democracia, direitos humanos básicos que é bom, nem pensar.
Alguns dias atrás, no Festival Literário de Araxá, Minas Gerais, o escritor angolano José Eduardo Agualusa falou que no exterior se tem uma noção mais clara do que acontece no Brasil: “Não acho que aqui seja uma questão entre esquerda e direita, não acho mesmo. Aqui é uma luta entre inteligência e estupidez, entre civilização e barbárie”.
É uma síntese perfeita, absolutamente perfeita – mas é muito maior do que uma referência ao Brasil. É a definição do que há hoje no mundo, em todo o planeta, nesta tristíssima época de avanço do populismo nos Estados Unidos, Brasil, Hungria, Polônia, Turquia, estes tempos sombrios de Donald Trump, Jair Bolsonaro, Viktor Orbán, Mateusz Morawiecki, Recep Tayyip Erdogan.
Não é uma questão entre esquerda e direita. É a luta entre inteligência e estupidez, entre civilização e barbárie.
É a luta entre os que defendem a luz e os que querem as trevas.
Em seu artigo do último domingo, 23/6, no Globo, em que citou a fala do escritor angolano José Eduardo Agualuza, Miriam Leitão enumerou a série de temas que estão em jogo:
“Há valores que são universais e a eles é que devemos deferência e não à cada vez mais enganosa fronteira entre direita e esquerda. O esforço é para manter conquistas, que dávamos como garantidas, como a autonomia da mulher, o respeito à orientação sexual, o combate ao racismo, a proteção do meio ambiente, a defesa dos povos indígenas. Por sobre esse pacto básico civilizatório, podem ser explicitadas diferenças sobre questões em que grupos políticos tenham visões diferentes. O problema no Brasil atual é que a clivagem começa a ser sobre os valores universais.”
De novo: não é o problema apenas no Brasil atual – é no mundo todo.
Claro, a situação do Brasil é especialmente alarmante, já que elegemos para a Presidência da República um sujeito que representa com perfeição a defesa das Trevas, a luta contra a Luz. A cada dia, incansavelmente, Jair Bolsonaro vem a público fazer o ataque veemente contra algum ponto dos bons valores universais, sejam pequenos detalhes, como a necessidade de se exigir o uso de cadeirinhas para crianças nos carros, sejam nos temas mais amplos, como a defesa do meio ambiente.
Mas o que está em jogo é o avanço dos defensores das trevas no mundo inteiro. É uma questão planetária.
Após 6 mil anos de civilização, estamos correndo o risco de perder conquistas que há muito dávamos como garantidas, como diz Míriam Leitão. Os princípios básicos, os direitos humanos fundamentais.
Até mesmo o respeito à Ciência! Os defensores das Trevas negam o evolucionismo, negam as mudanças climáticas, negam a obviedade tão fotografada e filmada que é a forma da Terra, dos demais planetas, das estrelas!
E está tudo, tudo, absolutamente tudo ligado, conectado. Não há peças soltas – é uma única engrenagem.
O governo Bolsonaro que teima em ignorar a mudança climática tem a ver com o governo Trump que faz de tudo para desmantelar a rede que tenta modificar os procedimentos da indústria e da população em geral em prol do meio ambiente. O governo Trump que insiste em pôr de pé as empresas de energia suja, como a do petróleo e do carvão, é o mesmo que consegue isolar dentro do espectro político do Irã o governo moderado, de bom senso, de Hassan Rohani – fortalecendo, consequentemente, os aiatolás mais fanáticos. É o mesmo que dá toda força ao radicalismo de Benjamin Netanyahu e, ao transferir a embaixada americana para Jerusalém, põe uma pá de cal sobre a possibilidade de uma política de dois Estados, o israelense e o palestino – a única capaz de dar alguma esperança de paz para o Oriente Médio.
Está tudo ligado, conectado. Apoiar Donald Trump, ou Jair Bolsonaro, ou Netanyahu, ou Orbán, Morawiecki, Erdogan, ou Castro, ou Maduro, ou Ortega, é defender as Trevas. É recusar a Luz.

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