29 de março de 2024
Ricardo Noblat

Sérgio Moro joga xadrez. Os políticos jogam damas

Sérgio Moro (Foto: Reiters)

Com um único lance que surpreendeu seus adversários, a Lava Jato fez ontem uma jogada de mestre: pela primeira vez desde que existe, ao invés de ameaçar um político ou um grupo de políticos, pôs em xeque todo um partido. O Partido Progressista (PP) foi acusado de improbidade administrativa. Se a acusação for aceita mais tarde pela Justiça, ele terá que devolver R$ 2 bilhões aos cofres do Estado.
A tudo assistiu à distância o juiz Sérgio Moro. Enquanto em Curitiba os procuradores da Lava Jato anunciavam a novidade, ele se ocupava em Brasília em debater a reforma do Código de Processo Penal. Foi obrigado a ouvir críticas diretas e indiretas de deputados da oposição, órfãos da ex-presidente Dilma e do ex-presidente Lula, que no dia 3 de maio irá depor em Curitiba. Mas não se incomodou.
Aos deputados parece ter passado despercebido outro movimento sutil do juiz: a escolha da cidade para assinar a sentença que condenou a 15 anos e quatro meses de prisão o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Brasília é o coração de todas as tramas em curso contra a Lava Jato. Conspira-se, ali, abertamente para sufocar ou impor limites à Lava Jato. Ela começou em Brasília ao investigar uma rede de postos de combustíveis.
O xeque ao PP, com a denúncia também de seis dos seus atuais deputados federais e quatro ex-deputados, significa que mais adiante outros partidos deverão ser alvos da mesma acusação. Natural que sejam. Beneficiaram-se de propinas como o PP. De recursos desviados da Petrobras como o PP. E vários dos seus membros enriqueceram igualmente. Quem garante que eles sobreviverão quando a Lava Jato tiver chegado ao fim?
Mais de um partido não sobreviveu à Operação Mãos Limpas, na Itália. Foi devastador para eles a descoberta do mar de lama que acabou por afogá-los. De resto, seus principais líderes foram fulminados pela operação, como aqui estão sendo as estrelas de partidos de todos os tamanhos. Os resultados das eleições do próximo ano poderão provocar um dos maiores expurgos políticos da nossa história.
Com o xeque ao PP e a condenação de Cunha, os procuradores e Moro desidrataram ainda mais o discurso de que o PT e Lula são vítimas de perseguição política e objetivos preferenciais da Lava Jato. Cunha, sem o qual o impeachment de Dilma jamais teria existido, está em situação pior do que Lula. O PP tem mais nomes envolvidos com a Lava Jato do que o PT. Tal condição poderá ser reivindicada no futuro pelo PMDB.
Fonte: Blog do Noblat

Ricardo Noblat

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

Jornalista, atualmente colunista de O Globo e do Estadão.

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