20 de abril de 2024
Adriano de Aquino Colunistas

Sócrates encontra professor da USP

Sócrates, enviado para 2017 em um vórtice temporal, cai em São Paulo, no meio de um manifesto, e encontra um militante esquerdista:

Imagem: Google Imagens – Mundo Educação

– Olá, excelente rapaz! Do que se trata toda essa gente reunida?

– Olha, velhote desinformado, estamos lutando contra a elite por justiça!

– Sim, eu realmente sou um desinformado, eu sou quem não sabe, mas estou muito feliz de encontrar você, que realmente sabe! Peço que me ensine, é possível?

– Sim, claro, sou da USP, tem muita coisa que você precisa aprender!

– É um grande dia, excelente rapaz! Finalmente encontrei alguém sábio que me ensinará! Primeiro, gostaria de saber o que é a elite, depois o que é justiça e por último por qual aplicação de justiça estão lutando. Pode ser nessa ordem?

– Sim, isso é fácil!

– Perfeito! O que é a elite!?

– A elite são os ricos, que têm muito dinheiro, muitos bens.

– Então, o critério para discernir a elite é a quantidade de dinheiro, de bens, que possui, certo?

– Sim, é esse mesmo!

– E a partir de que ponto um homem é considerado rico, participante da elite?

– A classificação disso é através classes sociais, que são A, B, C, D, E e F! A classe A é quem tem mais, e vai diminuindo para quem tem menos, até a classe F, que é praticamente miserável e não tem nada… é por eles que lutamos!

– Certo, como eu posso identificar quem é a elite nesses termos?

– São as classes A, B e C, mas é só ver quem ganha mais de 2.300 por mês, que já é elite!

– Entendi, e os outros todos não são elite, certo?

– Sim, o critério é esse.

– Quem ganha mais de 2.300 por mês é a elite, e a elite é malvada, certo?

– Certo!

– E quem ganha menos de 2.300 por mês não é da elite, e não é malvado, correto também?

– Sim, é exatamente isso! O senhor está aprendendo muito bem! Qual seu nome?

– Meu nome é Sócrates, excelente rapaz!

– Certo, Sócrates! Está aprendendo muito bem.

– Você é formado em uma universidade, não é isso?

– Sim! Sou inclusive professor! Da USP, como eu disse!

– Que dia maravilhoso para mim, excelente rapaz! Encontrei finalmente um sábio! Quanto ganha um professor da USP?

– Eu ganho 10 mil…

– Então…você é da elite e é malvado?

– Não… é que… olha… eu luto pelo povo e… eu quero só o bem dele!

– Mas você disse que o critério era esse…

– Eu sei, parece estranho, mas são nossos representantes que vão acabar com essas diferenças sociais!

– Estou me esforçando para compreender: quem são seus representantes?

– São os políticos!

– Quanto ganha um político hoje, rapaz?

– Depende: deputado ganha cerca de 39 mil por mês, um senador uns 33 mil…

– Então eles são da elite também!

– São, sim… mas são eles que vão fazer o bem para o povo!

– Mas você me disse que a elite só faz o mal, e que o critério é que quem ganha mais de 2.300 por mês é mau… tanto você quanto seus representantes são da elite, devo supor que são maus, segundo suas próprias palavras… ou será de outra forma?

– Estou desconfiando que você é um infiltrado, velho! Como pode duvidar do que estou dizendo?

– Eu estou tentando aprender, você disse que me ensinaria. Mas, afinal, você é um homem mau e seus representantes também são maus, ou esse critério estará errado?

– Eu não sou mau! Lula é santo! Que espécie de perguntas são essas?

– Chama-se lógica, rapaz, eu só estou examinando seu próprio critério… se o critério estiver certo, você e seus representantes são maus, se forem bons então o critério está errado… não será dessa forma?

– Está bem, talvez o critério esteja errado, pois eu sou um homem bom, e meus representantes também são bons, afinal estou lutando pela justiça, pelo bem, por algo bom!

– Muito bem, rapaz! E qual a luta de vocês?

– Lutamos contra os maus… quer dizer, a elite…

– Nos critérios que você me colocou?!

– Sim!

– Oras, estão lutando contra si mesmos!

– Não! Bem, talvez o critério esteja errado mesmo… não sei mais!

– Mas, me diga, o que é justiça?

– Justiça é que todos ganhem o mesmo salário! Para não haver desigualdade, sabe?

– Mesmo os que não trabalham?

– Não, só os que trabalham, claro…

– Então já não são todos… Concorda?

– Bem, quis dizer todos que trabalham; os que não trabalham ganham bolsas, essas bolsas é para que não fiquem sem nada…

– Essas bolsas são como um salário?

– Sim! Recebem uma vez por mês!

– E de onde sai o dinheiro dessas bolsas, rapaz?

– Impostos! As pessoas trabalham e pagam impostos, o estado redistribui a renda, e paga as bolsas.

– Então quem paga as bolsas é quem trabalha, e é justo que quem não trabalha receba salário por não trabalhar, e quem está trabalhando pague salário a quem não trabalha?

– Sócrates, você está me deixando confuso…

– Apenas me responda, a justiça consiste em pagar salário para quem não trabalha, é isso?

– Não… é redistribuir a renda…

– Mas, no final da sua redistribuição, isso é o que acontece, ou não?

– Sim, é… mas… tudo parece estranho, eu sei. Mas, quando fizermos o comunismo, tudo vai ser diferente, tudo vai ser justo e ninguém vai ser miserável, não vai dar pra você entender agora… a elite é poderosa e controla tudo!

– Rapaz, até agora tudo que você me disse foi contraditório, não?

– Sim, foi! É que você precisa esperar o comunismo acontecer! Aí, sim, tudo vai fazer sentido!

– Oras, rapaz, então esse tal comunismo, deve ser maravilhoso… onde aconteceu?

– Cuba, Coreia do Norte, Rússia, Alemanha Oriental…

– Então esses lugares devem ser o paraíso! Conte-me como são!

– Olha, as coisas não vão tão bem, alguns lugares já abandonaram o comunismo, mas os outros permanecem em luta!

– Rapaz, que surpresa! Por que afinal abandonaram algo tão maravilhoso?

– Não deu certo, mas continuamos tentando! É culpa do capitalismo!

– E os outros lugares?

– Cuba e Coreia do Norte continuam comunistas!

– Que maravilha! E como são esses lugares?! Estão bem? Todos são prósperos? Não existem mais classes?

– Pra falar a verdade, não estão bem não. Cuba e Coreia do Norte estão passando fome, mas isso é por culpa do capitalismo!

– Oras, mas um modelo tão bom, pelo qual vocês lutam, não faria apenas bem?

– É que os dirigentes não fizeram o comunismo como pensávamos, eles deturparam, fizeram outra coisa…

– Mas você me disse há pouco que eles eram bons…

– Eu disse mas… bem, nunca se sabe!

– Será que talvez vocês não estejam errados?

– Talvez, Sócrates…

– E por que esses países têm dirigentes?

– Eles têm poder militar, e muito capital…

– Oras, você me disse que não haveria classes sociais…

– No comunismo existem apenas as classes política e do proletariado!

– Então existem ainda classes, correto?

– Não tenho como discordar agora…

– Meu rapaz, não me parece que você esteja lutando por algo bom, pois seus exemplos foram todos maus, e não me parecem confiáveis seus representantes como bons, pois sempre terminam por trair o povo, e mesmo seus critérios não me parecem bons, pois não se sustentam agora, nem nos exemplos que me forneceu.

– O senhor está me deixando sem resposta. Eu preciso estudar mais…

– Eu agradeço pela conversa, mas vou continuar procurando alguém realmente sábio, que possa me ensinar algo de sua sabedoria.Um grupo de garotos se aproxima e cumprimenta o professor.

– Quem é este homem, professor?

– Um velho chamado Sócrates, que eu estava ensinando, mas agora estou um pouco confuso…

– Por que está confuso professor?

– Ele discordou de algumas ideias minhas, e eu não consegui sustentá-las…

O grupo de garotos grita:

– ATENÇÃO, TODO MUNDO! ESSE É UM VELHO FASCISTA! RACISTA! MISÓGINO! SEXISTA! HOMOFÓBICO!

Após levar cuspidas e apanhar, Sócrates sai ferido e desaparece no vórtice temporal.O professor da USP prossegue em sua luta mas, cada vez que vê um velho calvo de barba comprida, começa a tremer de medo”.

Texto de Ricardo Roveran

Adriano de Aquino

Artista visual. Participou da exposição Opinião 65 MAM/RJ. Propostas 66 São Paulo, sala especial "Em Busca da Essência" Bienal de São Paulo e diversas exposições individuais no Brasil e no exterior. Foi diretor dos Museus da FUNARJ, Secretário de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, diretor do Instituto Nacional de Artes Plásticas /FUNARTE e outras atividades de gestão pública em política cultural.

Artista visual. Participou da exposição Opinião 65 MAM/RJ. Propostas 66 São Paulo, sala especial "Em Busca da Essência" Bienal de São Paulo e diversas exposições individuais no Brasil e no exterior. Foi diretor dos Museus da FUNARJ, Secretário de Estado de Cultura do Rio de Janeiro, diretor do Instituto Nacional de Artes Plásticas /FUNARTE e outras atividades de gestão pública em política cultural.

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